O arrocho financeiro chegou ao Brasil, comprovando que o País, embora mais preparado para choques, não se tornou imune à crise internacional. Já estão mais caros até os empréstimos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), o mais importante financiador de projetos de investimento. A captação ficou mais difícil, mas a procura de recursos continua elevada. Esta é a boa notícia: grande número de empresas mantém a disposição de investir para modernizar o equipamento e aumentar a capacidade produtiva. Para atender ao maior número possível, a solução é cobrar mais pelo crédito. Parte dos financiamentos tem sido negociada a um custo superior à Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP), fixada em 6,25% ao ano desde julho do ano passado.
Empresas brasileiras começaram a sofrer os efeitos do aperto financeiro internacional há alguns meses. Com o agravamento da crise nos Estados Unidos e noutros países do mundo rico, o acesso ao crédito externo ficou mais difícil. Durante anos, os bancos estrangeiros emprestaram dinheiro fartamente a bons e a maus tomadores, em todo o mundo, e deixaram-se envolver na bolha hipotecária. Meses depois do estouro, quando a extensão do desastre ficou mais clara, inverteram a tendência e o crédito global encolheu.
Poderá encolher ainda mais durante a fase de recuperação e de reorganização das instituições financeiras nos principais mercados.
O BNDES deverá cumprir neste ano o desembolso previsto de R$ 85 bilhões, segundo seu presidente, Luciano Coutinho. O banco, acrescentou, já tem recursos para trabalhar "com tranqüilidade" durante o primeiro semestre de 2009. O presidente do Banco do Brasil, Antônio Lima Neto, disse não haver nem luz vermelha nem luz amarela para o financiamento, mas admitiu que as linhas de financiamento externo estão mais escassas e mais caras. Se nenhuma luz se acendeu, pode ser por falta de eletricidade.
O otimismo não muda os fatos. As condições do mercado internacional mudaram e ninguém sabe quanto tempo a crise vai durar. A retórica não anula, também, as novas condições de operação adotadas pelo BNDES. Reportagem publicada no Estado de ontem cita o caso de uma empresa que recebeu proposta de financiamento de 70% de seu projeto, sendo 40% pela TJLP e 30% pelo IPCA, mais juros de 3,5%, além do spread relativo ao risco.
Essa e outras negociações semelhantes foram confirmadas pelo superintendente do BNDES, Cláudio Bernardo Guimarães de Moraes. Segundo ele, a idéia é cobrar apenas a TJLP, ou pouco mais que isso, apenas para projetos de inovação e de bens de capital. Outras fórmulas devem ser escolhidas para os financiamentos a outros investimentos, incluídos os projetos de infra-estrutura.
O presidente do BNDES procurou transmitir tranqüilidade aos empresários participantes, na terça-feira, do Fórum Nacional da Indústria, promovido em São Paulo pela Confederação Nacional da Indústria (CNI). De fato, não há motivo para pânico, pelo menos por enquanto, mas os empresários conhecem a situação do mercado financeiro e a dificuldade de obtenção de empréstimos.
"As operações de crédito estão extremamente seletivas", disse o presidente da Associação Brasileira da Infra-Estrutura e das Indústrias de Base (Abdib), Paulo Godoy. Apesar disso, e das perspectivas de menor crescimento, ressalvou, quem tem projetos de longo prazo dificilmente os abandonará.
O presidente da CNI, deputado Armando Monteiro Neto, confirmou as dificuldades de financiamento e especialmente de renovação de linhas de crédito externas. Nesse quadro, declarou, a atuação do BNDES deverá ser especialmente importante para a sustentação do investimento. Ele pode estar certo, mas falta saber de onde virá o dinheiro necessário e qual será seu custo.
Recursos fiscais poderiam ser uma solução de curto prazo para reforçar o caixa do BNDES, mas o governo deveria evitar esse caminho. O Orçamento federal já está sobrecarregado de gastos de custeio. A sobrecarga aumentará nos próximos anos, com o recém-aprovado aumento de salários para o funcionalismo. É hora de abandonar a retórica otimista e de pensar com seriedade sobre a melhor combinação de políticas para atravessar a crise com o mínimo de danos e de seqüelas.
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