sábado, 30 de julho de 2011

De Romero Jucá para Michel Temer: 'Se você execrar o meu irmão, eu vou te foder'

Luiz Inácio Apedeuta da Silva já se mobilizou para que tenha fim o esforço moralizador do governo. Ele quer que fique tudo como está, com cada corrupto em seu lugar, garantindo o equilíbrio do conjunto. Gilberto Carvalho, seu espião no Planalto, secretário-geral da Presidência, mandou um recado à base aliada: “Não haverá caça às bruxas”. Queria dizer com isso que, agora, vai ficar tudo bem, que o preço da governabilidade é a eterna impunidade. Esse é um raciocínio que, incrivelmente, começa a fazer frutos no Brasil. Um colunista da Folha Online até lançou uma questão que há de excitar a curiosidade acadêmica: Obama só estaria enfrentando dificuldades por falta de um PMDB… Então vamos falar um pouquinho sobre o… PMDB!

Há um mês, vocês se lembram, VEJA trouxe à luz as lambanças no Ministério dos Transportes. Até agora, já houve 22 demissões, incluindo o ministro, Alfredo Nascimento, do PR. Na semana passada, a revista informou que Oscar Jucá, então diretor financeiro da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento), órgão do Ministério da Agricultura, havia autorizado o pagamento de R$ 8 milhões a uma empresa-fantasma que tinha como sócios um pedreiro e um vendedor de carros. Oscar, que é irmão de um Jucá mais famoso, o Romero — líder do governo no Senado (PMDB-RR) —, foi demitido por Wagner Rossi, ministro da Agricultura. Rossi é considerado um dos homens fortes do vice-presidente Michel Temer.

O caso esquentou. Romero pegou o telefone e ligou para o vice-presidente: “Se você execrar o meu irmão, eu vou de foder”. O interlocutor respondeu que sua própria manutenção como líder do governo estava condicionada à demissão do irmão. Os dois negam que a conversa tenha tido esse tom. Bem, o fato é que Oscar deixou o posto, mas decidiu botar a boca no trombone em entrevista à VEJA desta semana.

Segundo o ex-diretor, existe uma verdadeira máfia tomando conta da Conab, e PMDB e PTB dividem os frutos da roubalheira. A estatal estaria, por exemplo, protelando o pagamento de uma dívida de R$ 14,9 milhões à empresa Caramuru Alimentos porque se está negociando um, atenção!, pagamento maior: R$ 20 milhões. Os R$ 5,1 milhões  a mais iriam para o bolso da cúpula do Ministério. Outra lambança: em janeiro deste ano, um terreno pertencente à empresa foi vendido por R$ 8 milhões, um quarto do valor de mercado. O comprador é um amigo do senador Gim Argello (PTB-DF). Oscar é taxativo: “A Conab é pior do que o Dnit”. Segundo ele, o esquema envolve o próprio ministro da Agricultura; o presidente da estatal, Evangevaldo Moreira dos Santos, e o procurador-geral, Rômulo Suls Gonsalves Júnior, ambos do PTB.

Leia íntegra da reportagem na revista desta semana. Seguem trechos da entrevista de Oscar Jucá à VEJA. Volto em seguida:

(…)
O senhor está insinuando que o ministro da Agricultura está envolvido com irregularidades?
Tenho convicção disso, mas não tenho como provar. O ministro é um homem do Michel Temer. Faz o que o Temer manda. Mostrou que é poderoso. Deve proporcionar ao vice-presidente muita coisa boa, que eu com certeza não proporcionaria.

É fato que seu irmão reagiu às acusações feitas contra o senhor ameaçando o vice-presidente da República?
Meu irmão deu um recado duro, muito firme ao vice-presidente Temer: não permitiria que eu fosse execrado publicamente. Todo o meio político sabe dos detalhes dessa conversa.

(…)
E o terceiro encontro?
O ministro me chamou outra vez ao gabinete dias depois. Dessa vez mais calmo, sugeriu que eu pensasse na possibilidade de mudar de cargo e disse num tom de voz enigmático: “Fica tranqüilo que você vai participar de tudo”.

O senhor entendeu isso de que maneira?
Receber dinheiro por fora.

Propina?
É, para eu ficar quieto. E eu não topei. Dias depois, quando vocês publicaram a matéria, o Milton Ortolan (secretário executivo do Ministério da Agricultura) ligou e disse que a minha situação era insustentável, que era para eu pedir demissão: “Oscar, fica tranqüilo porque nós vamos tentar compensar a sua perda salarial em outro lugar”. Eu não aceitei e decidi sair. Ali só tem bandido, e não vou trabalhar com bandidos.

Voltei
Sim, meus caros, é isto mesmo: o irmão do líder do governo no Senado acusa o ministro da Agricultura de lhe ter oferecido propina para que se calasse sobre as lambanças numa empresa pública. E eles são todos do mesmo partido, o PMDB — aquele que faria falta a Barack Obama…

Mas Gilberto Carvalho já anunciou: “Nada de caça ás bruxas!”

O lulo-petismo quer as bruxas soltas para tomar conta do governo, desde que o PT esteja no comando. Por isso Lula voltou a reclamar da imprensa.

É verdade, né? Com a VEJA fazendo essas coisas, não há corrupto que governe em paz, pô! >

Por Reinaldo Azevedo


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Roubalheira na ANP: O dinheiro era para o partido

PCdoB, ANP e a idelogia da propina: Advogada que gravou o vídeo da corrupção na ANP afirma a ÉPOCA que a propina exigida na gravação acabaria nos cofres do partido – cujos dirigentes comandam com mão de ferro a agência

Diego Escosteguy, Revista Época

O comunista Haroldo Lima não detém conhecimentos técnicos sobre petróleo, mas sabe tudo de política. Aos 71 anos, o atual diretor-geral da Agência Nacional do Petróleo (ANP) já fez muito pela esquerda. Militou no movimento estudantil, fundou a organização Ação Popular, a AP, na qual combateu a ditadura militar, e, há 39 anos, apaixonou-se pelo PCdoB. É um dos mais antigos e dedicados quadros do partido, pelo qual cumpriu cinco mandatos como deputado federal. Num deles, elegeu-se com o mote “botando para quebrar”. A exemplo de tantos outros políticos de sua geração, sacrificou-se pelos ideais da esquerda, mas capitulou aos encantos da direita. Em 2003, em reconhecimento a seus serviços, o então presidente Lula nomeou Haroldo para uma diretoria na ANP.

Desde então, Haroldo socializou cargos e contratos entre os camaradas do PCdoB. Fora, assegurou – com muito custo – o próspero acúmulo de capital dos grandes empresários do setor petrolífero. Essa ambiguidade de papéis, subproduto do aparelhamento partidário do Estado brasileiro, não poderia dar certo. Conforme revelou ÉPOCA na capa de sua última edição, viraram regra a cobrança de propina e os achaques a empresários que precisam das canetadas dos burocratas da ANP. A reportagem trouxe a público evidências fortes da corrupção na ANP, como cheques, e-mails, relatos de empresários extorquidos – e até um vídeo em que uma advogada que atua no ramo é achacada por dois assessores da ANP. Todo o material integra uma investigação sigilosa, iniciada pelo Ministério Público Federal no Rio de Janeiro.

No vídeo, gravado em maio de 2008, Antonio José Moreira, então procurador da ANP, e Daniel de Carvalho Lima, estagiário da agência, cobram R$ 40 mil da advogada Vanuza Sampaio para liberar o registro de um cliente dela, a distribuidora de combustíveis Petromarte. Ambos dizem falar em nome do dirigente do PCdoB Edson Silva, então superintendente de Abastecimento e hoje assessor de Haroldo Lima. Os dois assessores da ANP dizem no vídeo que o valor de R$ 40 mil foi estipulado por Edson Silva e que ele receberia R$ 25 mil do total.

Assim que a reportagem foi publicada, a direção da ANP, em vez de determinar a investigação dos fatos, esforçou-se por tentar desqualificar o caso. A ANP chegou a anunciar que a advogada Vanuza foi interpelada judicialmente – e que ela teria negado qualquer acusação contra o comunista Edson Silva. Não é verdade. “Fui interpelada em razão de uma matéria que saiu na imprensa contra o senhor Edson Silva. Apenas neguei que fosse fonte da referida matéria. Nunca voltei atrás em nada”, disse a advogada Vanuza. Ela, diante da repercussão do caso, aceitou falar a ÉPOCA na semana passada. Vanuza esclareceu, sobretudo, o que já se suspeitava: os dois assessores da ANP disseram a ela que o dinheiro cobrado iria para o caixa do PCdoB (leia a entrevista) .

Não é por acaso que a ANP reagiu agressivamente às acusações: até a máquina publicitária da agência tem muitas afinidades com Haroldo Lima – e depende dele. A Leiaute Propaganda, agência baiana contratada pelo baiano Haroldo Lima para comandar a publicidade da ANP, tem entre seus sócios amigos e camaradas do próprio Haroldo Lima. Sidônio Palmeira e Liani Sena, dois dos donos da Leiaute, são filiados ao PCdoB, segundo registros do Tribunal Superior Eleitoral. Antônio do Carmo, até há pouco tempo diretor da Leiaute, integrou o PCdoB por 18 anos. Os laços entre Sidônio Palmeira e Haroldo Lima são antigos: eles militaram juntos no movimento estudantil da Bahia. Hoje, a ANP do comunista Haroldo Lima gasta R$ 7,7 milhões anuais com a empresa de Sidônio. A mesma Leiaute prestou serviços nas últimas campanhas eleitorais do petista Jaques Wagner ao governo da Bahia, disputadas com o apoio do PCdoB. (Hoje, a Leiaute também detém as contas publicitárias do governo da Bahia.)

Uma das sócias da Leiaute, Liani Sena, disse que nem ela nem Sidônio Palmeira são ou já foram filiados ao PCdoB, apesar das evidências em contrário. Ela afirmou ainda que o contrato da agência com a ANP obedece a todas as exigências da lei. “Foi um processo de licitação legal do governo federal”, disse. Procurada, a ANP, em resposta a perguntas enviadas pela reportagem de ÉPOCA, disse que o contrato com a Leiaute foi “auditado pelos órgãos de controle externo, que nunca registraram qualquer irregularidade na sua execução”.


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Opinião do Estadão: O ''PAC'' que funciona

Eunício Oliveira (PMDB/CE), presidente da Comissão de Constituição e Justiça do Senado, venceu uma licitação fraudada de R$ 300 milhões na Petrobrás

O sistema de vale-tudo nas relações entre a burocracia do Executivo, parlamentares e as empresas que conhecem o caminho das pedras para fazer negócios com a área federal engendrou no governo Lula um outro "PAC", mais bem-sucedido do que o original. Seria o Programa de Aceleração da Corrupção. Diga-se desde logo que conluios entre servidores venais, políticos de mãos sujas e negociantes desonestos não são uma exclusividade nacional e tampouco surgiram sob o lulismo. Mas tudo indica que a roubalheira na escolha dos fornecedores de bens e prestadores de serviços ao Estado brasileiro e nos contratos que os privilegiaram alcançou amplitude nunca antes atingida na história deste país nos governos petistas, e não apenas em função do patamar de gastos públicos. Mais decisivo para o resultado estarrecedor a que se chegou foi o perverso exemplo de cima para baixo. No regime do mensalão e das relações calorosas entre o presidente da República e a escória da política empoleirada em posições-chave no Parlamento, corruptores e corruptíveis em potencial se sentiram incentivados a assaltar o erário com a desenvoltura dos que nada têm a perder e tudo a ganhar. Nos últimos 30 dias, as histórias escabrosas trazidas à tona pelos escândalos revelados no Ministério dos Transportes tiveram o impacto de uma bomba de fragmentação que lançasse estilhaços em todas as direções da capital do País. Mas elas parecem apenas uma amostra do que vinha (e decerto ainda vem) se passando na máquina federal.

Ao passar o pente-fino em 142 mil licitações e contratos do governo assinados entre 2006 e 2010, referentes a obras e serviços no valor de R$ 104 bilhões, o Tribunal de Contas da União (TCU) topou com escabrosidades que caracterizam um padrão consolidado de delinquência, evidenciado em praticamente todos os aspectos de cada empreendimento (Estado de sexta-feira). As licitações se transformaram no proverbial jogo de cartas marcadas. Não apenas o governo fechava negócios com firmas cujos sócios eram servidores públicos aninhados no próprio órgão que encomendava a empreitada, mas em um dos casos esses funcionários integravam a comissão de licitação que acabaria por dar preferência às suas respectivas empresas.

Licitações eram dispensadas sem a apresentação de justa causa. Só uma empresa interessada ganhou 12 mil licitações; desistiu de todas para favorecer "concorrentes" que haviam apresentado lances mais altos. Duas ou mais empresas com os mesmos sócios participaram de 16 mil disputas. Cerca de 1.500 contratos foram assinados com empresas inidôneas ou condenadas por improbidade. Aditivos da ordem de 125% sobre o valor original - o limite legal é de 25% - engordaram 9.400 contratos. As irregularidades, que somam mais de 100 mil, "estão disseminadas entre todos os gestores", concluiu o relatório de 70 páginas da mega-auditoria realizada pelo tribunal de abril a setembro do ano passado.

Lamentavelmente, o tribunal manteve em sigilo - salvo para as Mesas da Câmara e do Senado, e o Ministério Público Eleitoral - a relação de parlamentares sócios de empresas contratadas pelo governo. A participação dos políticos nesses negócios ajuda a fomentar a corrupção, em razão dos seus íntimos entrelaçamentos com os centros de decisão no aparato administrativo. Além disso, a Constituição proíbe explicitamente que empresas que tenham parlamentares entre os seus sócios sejam contratadas pelo governo. Para contornar essa barreira, os políticos costumam deixar a gestão direta de suas firmas. Em pelo menos um caso, porém, o mandatário não se pejou de assinar ele próprio o contrato com uma repartição pública.

Quanto aos políticos citados no relatório, só dois nomes são conhecidos, graças ao trabalho de reportagem do Estado. São o senador e ex-ministro das Comunicações (afastado por suspeita de ilícitos) Eunício Oliveira e o notório deputado Paulo Maluf. Uma empresa do primeiro venceu uma licitação fraudada de R$ 300 milhões na Petrobrás. Uma empresa do segundo alugou um imóvel para o governo por R$ 1,3 milhão ao ano. Com "dispensa de licitação".

Vamos aguardar a divulgação da lista em poder dos membros das mesas do Senado e da Câmara dos Deputados.


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sexta-feira, 29 de julho de 2011

A Copa da roubalheira: Dinheiro público para estádios embaraça Fifa

Almir Leite, Bruno Lousada, Sílvio Barsetti e Wagner Vilaron - O Estado de S.Paulo

Até a Fifa fica sem graça quando o assunto é o uso de dinheiro público na construção de estádios para a Copa de 2014. Ontem, em conversa com jornalistas brasileiros em um luxuoso hotel do Rio, o secretário-geral da entidade, Jérome Valcke, ficou visivelmente embaraçado ao falar do tema. Pensou bastante e, ao responder, evocou o "poder do futebol" para tentar justificar a gastança.

"No Brasil, temos uma mistura de financiamento público e privado", disse Valcke. "O dinheiro que será gasto nos estádios não se compara ao que será gasto nas estradas, aeroportos."

O tema causa desconforto porque em 2007 o presidente da CBF, Ricardo Teixeira, disse que não haveria dinheiro público na construção de arenas. Quase quatro anos depois, o que se observa é que até mesmo estádios particulares contam com essa ajuda.

O Itaquerão foi beneficiado por incentivo fiscal da Prefeitura de São Paulo de R$ 420 milhões, além de cerca de R$ 70 milhões que o governo estadual desembolsará para deixá-lo apto para a abertura da Copa. Sem contar os R$ 65 milhões em isenção de impostos federais.

A Arena da Baixada, do Atlético-PR, contará com pelo menos R$ 90 milhões por meio de um mecanismo da Prefeitura de Curitiba, chamado Transferência de Potencial Construtivo (permite edificações acima do padrão da Lei de Zoneamento em troca de repasses financeiros a obras de interesse público) que permitirá ao clube se capitalizar.

Valcke argumenta que, no Brasil, o futebol é uma "religião" e que tudo que for investido na Copa, não só em estádios, trará benefícios futuros. "Temos de ver o panorama geral e ver o que significa depois como legado."

O secretário-geral foi mais incisivo quando questionado sobre os R$ 30 milhões que a Prefeitura do Rio e o governo estadual desembolsaram, em partes iguais, para viabilizar o sorteio dos grupos das Eliminatórias, amanhã. "Nós, da Fifa, não pedimos ao governo ou à prefeitura para gastar esse dinheiro para o evento. Eles decidiram por isso", afirmou. "Se uma instituição qualquer pública ou privada decidir pagar por isso, a escolha é deles."

O Comitê Organizador Local (COL) deu a uma empresa de eventos a organização do sorteio e também a captação de patrocinadores. Prefeitura e governo do Rio decidiram investir, argumentando benefícios para a imagem da cidade. Rodrigo Paiva, assessor de comunicação do COL, disse que os R$ 30 milhões cobrem apenas parte dos custos. "O valor é bem maior. O comitê também colocou dinheiro no evento."

Hoje, o espaço da Marina da Glória onde ocorrerá o sorteio vai ser inaugurado oficialmente, às 11 horas, por Ricardo Teixeira. O ministro do Esporte, Orlando Silva, vai participar do evento.


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quarta-feira, 27 de julho de 2011

Lá se vão os anéis

Dora Kramer - O Estado de S.Paulo

De concreto, as denúncias de superfaturamento de obras e cobrança de propinas no Ministério dos Transportes resultaram em 18 demissões e na avaliação geral de que a presidente Dilma Rousseff está promovendo uma "faxina" em regra na área.

Tudo o mais está muito esquisito. A começar pelo alheamento do ministro da Justiça e a discrição da Polícia Federal, outrora convocada a avalizar a disposição do governo federal no combate à corrupção.

Sobre o tema o ministro José Eduardo Cardozo até agora se limitou a dizer que a PF "há tempos" investiga o que se passa no ministério. Nos casos que fizeram a presidente demitir ministro e companhia mais a diretoria do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes, a polícia está avaliando a possibilidade de atender aos pedidos de investigação feitos pela oposição.

"Se a PF provar alguma irregularidade, seguramente apontará para uma ação penal", afirmou.

Como assim, "se" for provada "alguma irregularidade"?

A presidente da República não acabou de demitir 18 pessoas, justamente baseada na conclusão de que havia não "alguma irregularidade", mas a ocorrência de crimes que caracterizam prevaricação?

Qualquer entendimento diferente deste leva à conclusão de que a presidente foi leviana e quis apenas buscar popularidade com o pescoço alheio. Cometeu grave injustiça e, com isso, dá razão a dois dos demitidos que contestaram publicamente a decisão de Dilma.

Luiz Antonio Pagot, ex-diretor geral do Dnit, e Hideraldo Caron, responsável pela diretoria de Infraestrutura Rodoviária.

O primeiro foi ao Senado e à Câmara dizer que nada havia feito de errado e todas as suas ações eram do pleno conhecimento da presidente, a quem tivera oportunidade de esclarecer as razões da "mudança de escopo" (sinônimo não contabilizado para aumento de custos) das obras do PAC.

Foi celebrado como cidadão acima de qualquer suspeita por senadores e deputados da base governista e, no ato de apresentação de sua demissão, o fez em meio aos aplausos de 500 funcionários do Dnit, em desagravo orquestrado.

O segundo dos demitidos com honras de Estado - a ambos foi conferido o privilégio de tomar a iniciativa -, o petista Hideraldo Caron, também alegou não existir "nada de concreto" sobre ele, justificou que saía "por razões políticas" e ainda considerou "exageradas" as providências tomadas pela presidente.

A tudo o Palácio do Planalto assistiu passivamente, como se o temporário ônus pagasse o bônus do "upgrade" à imagem da presidente como operadora da mudança de hábitos na Esplanada dos Ministérios e adjacências.

O governo restringiu-se a ações administrativas onde, por suposto, houve crimes. Passíveis de punições bem mais graves que tão somente demissões a partir das quais os demitidos sempre poderão alegar adiante que nada pesa contra eles.

Uma coisa são demissões, outra bem diferente são processos que podem resultar em condenações. A primeira diz respeito aos anéis e a segunda aos dedos.

Até agora preservados. Fala-se em "comprovações" e possíveis "absolvições", mas para haver culpa ou inocência é necessário que haja inquéritos, denúncias e processos.

A presidente reafirma disposição de levar a limpeza "até o fim", mas do palácio saem versões de que há preocupação com os demais aliados.

A fim de evitar fissuras "na base", o PMDB, por exemplo, estaria a salvo. Esses ministros dizem que a presidente daqui em diante será mais "cautelosa" (teria sido ela, então, incauta?) no trato de partidos com lastro mais pesado que o mediano e mal-afamado PR.

A presidente, nessa interpretação, teria noção de peso e medida, evitando atiçar marimbondos com fogo.

A corresponderem aos fatos tais versões, o PMDB seria poupado não por ser correto, mas por ser poderoso. O que faria a faxina recender a autopromoção.

Xeque. Pelo sim pelo não, o PMDB prepara nota oficial, assinada por todos os ocupantes de cargos do partido, pedindo que o governo divulgue se souber de algo que os desabone.


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segunda-feira, 25 de julho de 2011

Opinião do Estadão: Titulares e pernas quebradas

"Oposição é como jogador no banco (de reservas). Torce para o titular quebrar a perna." Há várias maneiras de interpretar essa tirada de pretenso humor de Lula, desta vez proferida na sede da Fiesp, onde o ex-líder metalúrgico foi homenageado com um jantar e uma exposição de fotos de seus dois mandatos na Presidência da República. Quem está atento à sucessão de episódios relacionados a denúncias de corrupção que têm exposto divergências da turma do ex-presidente no governo com a sucessora Dilma Rousseff pode perceber que, na verdade, quem anda fazendo oposição à titular do Planalto são os fiéis seguidores de Lula, à frente Gilberto Carvalho, ministro-secretário-geral da Presidência. E se o ex-presidente e seus fiéis escudeiros estão convencidos de que Dilma anda pisando na bola, e com isso comprometendo o projeto petista de uma longa permanência no poder, não há por que imaginar outra coisa: Lula já se pôs em campo como candidato a retornar à Presidência, não em 2018, mas já em 2014. E como todo jogador que está no banco, como ele diz, torce para o titular quebrar a perna.

É o que mostra o esforço do ex-presidente para se manter em evidência no noticiário, coisa que sempre soube fazer muito bem, não importa a que custo. Só nas últimas duas semanas foram três ocasiões e sempre a mesma e invariável atitude: o defensor dos fracos e oprimidos contra as elites. A primeira, em congresso da cooptada UNE realizado no Rio de Janeiro, insistiu na tecla de que a "imprensa golpista" não desiste de lhe "pegar no pé", a serviço de interesses inconfessáveis que ele, se conhece, não revela. A segunda, em congresso da União Geral dos Trabalhadores (UGT) em São Paulo, na qual colheu aplausos entusiasmados ao afirmar que as elites - que, como de hábito, não especificou - "não se conformam" porque hoje os trabalhadores têm acesso a bens que antes estavam fora de seu alcance, como automóveis zero-quilômetro e viagens aéreas. E a terceira, no próprio quartel-general dos patrões dos metalúrgicos, onde acabou cometendo talvez um ato falho com suas imagens futebolísticas.

A versão benévola de que Lula não estava pensando em Dilma quando mencionou titulares de perna quebrada não elide o fato de que a imagem usada, ela própria, é altamente comprometedora para ele, que não hesita em propagandear irresponsavelmente, como prática corriqueira e moralmente aceitável, o levar vantagem em tudo, o recurso a qualquer meio para atingir os fins desejados. Pois não é outra a ideia que traduz a frase infeliz que, a pretexto de fazer graça, traz subjacente um enorme potencial de dissolução moral: "Oposição é como jogador no banco (de reservas). Torce para o titular quebrar a perna". É uma afirmação absurda, descabida, que revela, no mínimo, ausência do sentimento de solidariedade humana, na boca de alguém que tem a responsabilidade de se comportar como líder de uma grande massa de brasileiros. Essa sempre foi a prática de Lula na luta sindical e no papel de oposicionista, à frente do PT: mais do que a torcida, o trabalho para fazer "o titular quebrar a perna". Foi assim quando, sob seu comando, os petistas votaram contra a eleição indireta de Tancredo Neves na disputa com Paulo Maluf, o candidato da ditadura militar; foi assim quando, sob seu comando, os petistas votaram contra a Constituição de 1988, que se propunha a redemocratizar o País depois da queda da ditadura militar; foi assim quando, sob seu comando, os petistas fizeram campanha contra o Plano Real e contra todas as outras medidas reformadoras do aparelho do Estado e da economia implantadas pelo governo tucano que o antecedeu.

Nada disso é novidade. Tudo isso tem sido repetido insistentemente nos últimos tempos, pelo menos, pela imprensa que continua cumprindo o papel democrático de investigar e denunciar o assalto dos partidos da situação aos cofres públicos. A imprensa que insiste em demonstrar, com um trabalho jornalístico responsável, que depois de oito anos de exaurimento ético a máquina do Estado ameaça implodir moralmente, sob o olhar perplexo da presidente Dilma. É fácil entender, diante disso, por que Lula jamais desiste da ideia de quebrar as pernas da imprensa que não lhe "larga do pé". E de quem atravessa seu caminho.


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domingo, 24 de julho de 2011

Roubalheira nos Transportes: Afinal, para que serve o Dnit?

Com um orçamento bilionário e pouca fiscalização, o Dnit - foco do esquema de corrupção nos Transportes, revelado por VEJA - é alvo de cobiça de políticos

Luciana Marques e Gabriel Castro, Veja

Um antro de corrupção. Essa é a definição mais usada recentemente quando o assunto é o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), órgão vinculado ao Ministério dos Transportes - e foco do esquema de corrupção revelado por VEJA. Em meio a uma série de denúncias, a oposição chegou a sugerir a extinção da autarquia, criada há dez anos no governo de Fernando Henrique Cardoso. Na época, o objetivo era reunir em um só órgão o sistema de transportes rodoviário, aquaviário e ferroviário em substituição ao Departamento Nacional de Estradas de Rodagem (DNER) – que cuidava apenas das rodovias.

Hoje, o Dnit tem sede em Brasília e possui outras 23 superintendências regionais. Também há unidades locais para atender trechos de rodovias, que podem abranger cerca de trinta municípios. Além de contrução de novas vias, o órgão tem o papel de manter as estradas em boas condições. Algo que muitas vezes não é visível em rodovias sob a tutela do governo federal. À parte das estradas esburacadas e perigosas, o órgão possui um problema de gestão: a política está muito acima das preocupações técnicas.

"Não se deve destruir o Dnit com uma única condição: que ele seja honesto. O órgão é um câncer nacional. Tecnicamente, há pessoas competentes lá dentro, mas normalmente sem muito poder de decisão. Mesmo conhecendo a variação de custos, elas são pressionadas a se calar", avalia o professor de engenharia civil da Universidade de Brasília (UnB), Dickran Berberian.

Orçamento bilionário - O órgão é alvo de cobiça de políticos. Não por acaso. O orçamento previsto para este ano é de mais de 15 bilhões de reais. A quantia é muito superior a de ministérios inteiros, como o da Cultura (2,1 bilhões de reais), de Ciência e Tecnologia (8,1 bilhões de reais) e da Justiça (11, 2 bilhões de reais). Diz Berberian: "A relação custo-benefício do Dnit é baixíssima por causa do superfaturamento e incompetência". O Dnit já consumiu até agora mais de 2,7 bilhões de reais - praticamente 70% das despesas totais do Ministério dos Transportes para 2011.

O ponto de partida da corrupção no Dnit é o processo de licitação. Muitos editais são dirigidos, ou mesmo elaborados pela própria empresa participante do pregão – que assume "compromissos" com políticos do PR e do PT antes do leilão. Com isso, a construtora consegue incluir, entre as exigências previstas no edital, atestados de certificação específicos que dificilmente os concorrentes terão. Assim, empresas muitas vezes mais competentes e honestas são eliminadas do processo.

Também é comum as vencedoras conseguirem aditivos, que encarecem as construções. De acordo com a lei, só são permitidos contratos extras que somem até 25% do valor inicial da obra. Ocorre que muitas vezes essa porcentagem não é levada em consideração. Outro caso comum é a ausência de licitação em obras consideradas "emergenciais".   

Grande parte dos processos de concorrência é realizada pela sede. As superintendências são reponsáveis por licitações menores, para conservação de rodovias, por exemplo. Portanto, as principais decisões são tomadas de forma centralizada - por uma diretoria colegiada formada por sete representantes. Às unidades regionais cabe o papel mais restrito de acompanhar e fiscalizar as obras realizadas nos estados.

Funcionários

O Dnit também surpreende no que se refere ao número de servidores. São mais de 2.800, quantia sete vezes maior do que a do Ministério do Esporte, por exemplo. Desses, pelo menos 28 eram filiados ao PR antes na crise no setor. De acordo com o (ainda) diretor-geral do departamento, Luiz Antonio Pagot, o efetivo do Dnit é insuficiente para fiscalizar de perto as obras de responsabilidade do órgão.

No fim do ano passado, o departamento realizou uma licitação para contratação de funcionários no mínimo inustitada. A empresa vencedora, Tech Mix, separou caixas de currículos para apresentar ao Dnit, segundo informou ao site de VEJA o dono da empresa, Luis Carlos da Cunha. Mas a escolha ficou a cargo do próprio órgão – que preferiu selecionar os funcionários que já trabalhavam no local. Alguns deles apontam que não recebem os salários completos – que podem ter sido desviados para caixas de partidos.

Essa licitação, aliás, é cercada de suspeitas. O site de VEJA revelou que assinaturas de documentos entregues pela Tech Mix ao Dnit foram falsificadas. As irregularidades em torno do Dnit estão descritas em centenas de investigações e processos abertos pelo Tribunal de Contas da União (TCU), pela Controladoria Geral da União (CGU) e pela Polícia Federal (PF). Resta saber se a faxina realizada pela presidente Dilma Rousseff fará efeito - ou apenas trocará seis por meia dúzia.


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