quinta-feira, 8 de maio de 2008

Opinião do Estadão: Sabe, sim, por que ''apanha''

Suspeito de ter recebido propina de R$ 325 mil pela parte que lhe caberia pela concessão de empréstimos do BNDES para obras fantasmas, o deputado e dirigente sindical Paulo Pereira da Silva (PDT-SP) é um homem do seu tempo. Ele sabe que nos dias que correm pega bem em certos ambientes invocar a teoria da conspiração e dar-se ares de vítima para "desqualificar" - como disse numa conversa gravada pela Polícia Federal (PF) - indícios de malfeitorias. Foi o que fez na terça-feira, da tribuna da Câmara, atribuindo a "essa elitizinha que não gosta de trabalhador" as denúncias de seu envolvimento no esquema que teria extraído fraudulentamente da instituição algo como R$ 520 milhões, segundo apurou a PF no curso da Operação Santa Teresa.

"A unidade das centrais sindicais em defesa dos trabalhadores deixou muita gente com raiva", discursou o deputado. Entre os raivosos decerto inclui os responsáveis pela investigação que identificou como chefe da quadrilha - atuante também na Fundação Nacional da Saúde - o lobista, ex-assessor de Pereira da Silva e ex-conselheiro do BNDES, por indicação da Força Sindical, João Pedro de Moura. Um dos 13 indiciados no caso contra os quais a Justiça Federal de São Paulo abriu processo criminal, Moura está preso. Certo dia, a PF o filmou entrando com uma mochila no gabinete do amigo Paulinho, na Câmara. No BNDES, ele foi sucedido pelo advogado Ricardo Tosto de Oliveira Carvalho, outro apadrinhado da Força citado nas conversas comprometedoras interceptadas pelos federais. Responde ao processo em liberdade.

"Agora sei por que estou apanhando", tentou ironizar Pereira da Silva. De fato, deve saber desde a primeira hora - em sentido literal. No papel de vítima inocente dos inimigos da classe trabalhadora, proclamou que pedira à Procuradoria-Geral da República que abrisse o seu sigilo fiscal, bancário e telefônico. O ponto alto da farsa seria ele aparecer na mídia entregando a respectiva autorização ao procurador-geral Antônio Fernando de Souza. Para tanto se fez acompanhar de toda uma comitiva. Uma jogada fútil, afinal. O procurador, a quem compete decidir se requer ao Supremo Tribunal Federal a abertura de inquérito contra parlamentar detentor de foro privilegiado, não se prestou à encenação - e o destemido Paulinho teve de deixar o papel na portaria.

Esse detalhe vem a propósito para ilustrar o nível da "defesa" do deputado, considerada inconvincente. "Ele tem de provar na Justiça que não tem nada com aquela gente toda que foi presa", pensa o também pedetista Jefferson Peres. Solitário entre os seus, o senador propôs que o suspeito se licenciasse da executiva do partido. No mesmo patamar da presepada na Procuradoria está o que ele declarou ao deixar o plenário. "Acho que convenci", quis fazer crer. "Ninguém me contestou." Na realidade, as suas atribulações políticas podem estar apenas começando. Diante da gravidade do escândalo e talvez para não ficar a reboque da Justiça, o presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia, se antecipou à falação de Pereira da Silva, pedindo à Corregedoria da Casa que examine as denúncias que o atingem, embora não o tenha citado pelo nome.

Formalmente, depois de examinar o material que lhe tiver sido repassado - no caso, o que a imprensa noticiou a respeito das maracutaias no BNDES - e ouvir o parlamentar, o corregedor sugere à Mesa ou o arquivamento do assunto, por falta de provas, ou, no limite, a abertura de processo, no Conselho de Ética, por quebra do decoro parlamentar. Salvo surpresa, é pouco provável que este seja o caminho indicado pelo corregedor - o conhecido deputado pernambucano Inocêncio Oliveira, hoje no PR. Há quem manifeste ceticismo em relação ao próprio Conselho. Dias atrás, explicando por que o seu partido hesita em representar contra Pereira da Silva, a líder do PSOL, Luciana Genro, lembrou que, "em outras ocasiões, o conselho tem absolvido os deputados, que por sua vez usam esse resultado como atestado de idoneidade".

Em última análise, tudo dependerá de o procurador-geral pedir, e o STF instaurar, o necessário inquérito contra o pedetista.
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