A partir da descoberta de reservas gigantescas de petróleo abaixo da camada de sal, na Bacia de Santos, o presidente Luís Inácio Lula da Silva tem prometido mais recursos para a Educação pública. A promessa, no entanto, é vista com descrença por educadores, que não enxergam vontade política no Executivo para investir no setor. Amparado por um instrumento legal, o governo Lula já deixou de aplicar R$ 20,144 bilhões, que, por determinação constitucional, deveriam ter sido destinados à Educação de 2003 a 2007. O valor equivale a mais da metade do orçamento do Ministério da Educação para 2008, de R$ 38,409 bilhões, e seria suficiente para manter mais de 2 milhões de crianças matriculadas no Ensino Médio, considerando o gasto anual de R$ 1.004 por estudante, segundo dados de 2005 do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep).
Na Constituição está previsto que o governo federal deve aplicar no mínimo 18% da receita arrecadada com impostos na Manutenção e Desenvolvimento do Ensino (MDE), que inclui gastos como remuneração e aperfeiçoamento de professores, infra-estrutura e material didático-escolar. No entanto, desde 1994 vigora um dispositivo - a Desvinculação de Recursos da União (DRU) - que permite ao Executivo gastar como quiser 20% da sua receita com tributos. Dessa forma, a obrigatoriedade dos 18% passou a ser aplicada sobre o que sobra após a desvinculação de um quinto da arrecadação.
Desobrigado a investir, o governo acabou gastando menos em Educação. Segundo cálculo feito pela Campanha Nacional pelo Direito à Educação e pelo Globo Online a partir de dados do Tesouro Nacional, a MDE deixou de receber R$ 13,394 bilhões de 2003 a 2006 (valor atualizado pela inflação de 2006). Só em 2007, a perda chegou a R$ 6,750 bilhões, totalizando R$ 20,144 bilhões retirados da educação, pela DRU, no governo Lula. Além disso, segundo dados do Tribunal de Contas de União, R$ 5,377 bilhões foram contigenciados do orçamento previsto para Educação nesses cinco anos.
Entenda como funciona a DRU e o MDE
- A intenção do governo (em relação aos recursos do pré-sal) é positiva. Mas a discussão ainda está distante de quanto e como esses recursos serão aplicados na prática. E dinheiro já existe. O governo poderia estar fazendo mais pela Educação - afirma Daniel Cara, coordenador-geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação.
O professor da Faculdade de Educação da UFRJ Roberto Leher afirma que prometer recursos do pré-sal para Educação é, mais uma vez, adiar o enfrentamento do problema. Isso porque o pré-sal só deve começar a ser efetivamente explorado em 2010 e não se sabe ao certo o lucro que ele dará.
- O Lula diz que tiramos a sorte grande. Mas e se esse bilhete não for premiado? Não é correto jogar a solução do problema para um futuro incerto - criticou Leher. - O que eu acho desanimador nesta discussão do pré-sal é que ela joga a questão lá pra 2010, 2012. Em 2001, tivemos o Plano Nacional de Educação. Em abril do ano passado, o governo lançou o Plano de Desenvolvimento da Educação. Como a Educação não é uma prioridade real, faz-se um plano e, no fim, quando ele não dá certo, lançam outro, jogando a solução pro futuro. Esse é o caso do pré-sal - reclamou.
Na opinião de Leher, o problema é mais falta de vontade política do que de recursos. Dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) revelam que de 1995 a 2005 o investimento federal em Educação caiu em relação ao PIB (Produto Interno Bruto), passando de 0,95% para 0,77%. Segundo o professor da UFRJ, hoje os investimentos equivalem a 0,8% do PIB. Somados os recursos aplicados na área por União, estados e municípios, o investimento público em Educação chega a 3,5% do produto interno bruto. O valor está muito abaixo dos 7% a 8% recomendados pela ONU.
Leher lembra que países como a Coréia do Sul, na década de 70, aumentaram os investimento em Educação sem precisar de pré-sal ou outra fonte extraordinária de recursos. O que ocorreu, ele afirma, foi uma reorganização da alocação de recursos já existentes.
- A Coréia do Sul tinha um nível de desenvolvimento parecido com o nosso e chegou a investir 10% do PIB em Educação. Hoje, eles aprovam quatro vezes mais patentes do que nós. O aumento dos gastos foi uma escolha política que certamente exigiu o redimensionamento de outras despesas e nem por isso causou uma hecatombe econômica no país - afirmou.
Para o professor da Universidade Federal Fluminense (UFF) Nicholas Davies a DRU denota falta de compromisso do governo com o setor.
- Não é ilegal, mas é imoral - critica.
Davies, que é especialista em financiamento em Educação, cobra mais fiscalização sobre o uso dos recursos, que se perdem com corrupção ou, quando transferidos para estados e municípios, acabam muitas vezes aplicados em outras áreas. Especialista em políticas públicas, a professora da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) Bertha do Valle argumenta que, além de mais recursos, a Educação precisa de bons gestores para melhorar a qualidade da aplicação das verbas:
- Ás vezes o dinheiro é mal utilizado não por desonestidade, mas por falta de conhecimento sobre como gastar. Folha Online
Nenhum comentário:
Postar um comentário