Com mais de US$ 200 bilhões de reservas, o Banco Central (BC) tem muita munição para enfrentar uma onda especulativa no mercado de câmbio. Seu poder de fogo já foi demonstrado nos últimos dias quando voltou a oferecer dólares no mercado a vista pela primeira vez depois de cinco anos. As pressões no mercado cambial começaram quando se agravou a crise financeira nos Estados Unidos e na Europa. Aplicadores deslocaram dinheiro de mercados emergentes, como o Brasil, para cobrir perdas noutros países. Ficaram mais intensas quando algumas grandes empresas brasileiras tiveram de absorver prejuízos de apostas erradas em derivativos. A esses fatores acrescentou-se, enfim, um evidente movimento de especulação, com a moeda americana valorizando-se mesmo em dias de fluxo cambial positivo. Ontem, o BC voltou a intervir no mercado, embora o dólar, de manhã, recuasse tanto na BM&F quanto nas operações de balcão.
O agravamento da crise internacional mostra o acerto da acumulação de reservas. Essa estratégia foi criticada por analistas de várias tendências por causa de seu custo fiscal. Para comprar moeda estrangeira é preciso emitir moeda nacional, com efeito inflacionário, ou vender títulos públicos, endividando o Tesouro. O problema é saber se o preço é compensador. Neste caso, já não pode haver dúvida. O custo para o Brasil seria muito maior se o País entrasse nesta crise com um volume de reservas mais modesto.
Pressões cambiais em épocas de crise internacional são inevitáveis, e tanto mais fortes quanto mais vulnerável pareça o país. Um alto volume de reservas é conveniente não só para cobrir problemas de financiamento externo, previsíveis em tempos de turbulência internacional, mas também para enfrentar ondas de especulação.
Um dólar mais caro pode ser conveniente para o comércio exterior brasileiro, por baratear as exportações e encarecer as importações, mas é preciso evitar variações cambiais abruptas, tanto para cima quanto para baixo. Um mínimo de previsibilidade é necessário para o planejamento empresarial mesmo de curto prazo. As intervenções do BC no mercado cambial são, na maior parte das vezes, tentativas de manter uma certa ordem nos negócios e limitar o impacto das oscilações.
A depreciação do real, benéfica para as contas externas, poderá ser, no entanto, um fator de pressão inflacionária. Mas essa pressão, como observou o economista Charles Collyns, do Fundo Monetário Internacional (FMI), poderá ser compensada, com alguma folga, pela desaceleração econômica prevista para 2009. Triste consolo. Com o crescimento econômico diminuindo de 5,2% em 2008 para 3,5% no próximo ano, haverá uma folga maior de capacidade produtiva e isso contribuirá para a estabilização dos preços. É um argumento compatível com os princípios de política seguidos pelo BC. Neste momento é desejável, no entanto, impor um freio aos especuladores. E os dois dias de intervenção do BC mostram que isso vai custar muito menos do que se temia.
Quanto a problemas de financiamento externo, já se manifestaram, provocados pelo encurtamento do crédito internacional e pelo aumento da aversão ao risco. Por enquanto, não são tão graves quanto foram noutras ocasiões, mas já afetam as atividades econômicas. São especialmente graves, neste momento, a escassez de crédito para os exportadores e o atraso dos empréstimos para o plantio. Essas dificuldades podem refletir-se nas contas externas, somando-se a uma provável diminuição do investimento estrangeiro direto em 2009. Se a poupança recebida de fora for insuficiente para equilibrar o balanço de pagamentos, haverá reservas mais que suficientes para cobrir o déficit em conta corrente.
O BC está fazendo o que é possível para preparar o Brasil para enfrentar um período de crise que ninguém sabe quanto vai durar. Isso vai depender da ação dos governos do mundo rico e de sua capacidade de cooperação. O governo americano já dispõe de um plano de ação e a ação ousada do governo britânico, estatizando parcialmente alguns grandes bancos e comandando a liquidação de outros, é um sinal animador.
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