segunda-feira, 6 de outubro de 2008

Medalha de lata

Juca Kfouri

A eleição clandestina no COB revela que nem mesmo a atenção com as aparências sobrevive. Vale tudo

Carlos Nuzman chegou ao paraíso. Atingiu aquele ponto que só a pessoa sem nenhum problema de consciência, ou com todos, alcança: dane-se o que vão dizer de mim. O que tem a consciência tranqüila sabe que nada pode feri-lo. O que perdeu a vergonha na cara não está nem aí mais para coisa alguma, só quer desfrutar, pensem o que pensarem as pessoas, a opinião pública, o país.

A velhacaria de se realizar uma eleição clandestina para mais uma reeleição dá a medida da desfaçatez, do absoluto desprezo pela imagem, até então objeto de preocupação, fosse pelo exagero no uso de perfume, fosse pelo tique nervoso de quem queria aprovação.

Inesquecível, por exemplo, um encontro do cartola com este colunista, em 1995, quando alguém maliciosamente soprou em seus ouvidos que a revista "Placar" preparava uma reportagem contra ele.

Eis que, sem agendar, ele surgiu suado em minha sala para de lá sair em paz, ao ouvir que seria o primeiro a saber se fosse verdade, porque evidentemente seria procurado para dar sua versão.

Pois hoje em dia nem isso. Não se envergonha ao ver a vil manobra exposta na primeira página do principal jornal da cidade onde mora, ele que preferiu usar jornais menores para publicar o edital da convocação de sua clandestina reeleição, em desobediência ao estatuto da entidade que preside.

A Nuzman bastam as excelentes relações que mantém com o governo federal, seja na figura do ministro do Esporte, mais um que achou para carregar suas malas -a exemplo do cordeiro anterior-, seja com o presidente da República.

Nada mesmo como um dia após o outro. Nuzman fez aquilo que caracterizava o movimento sindical peleguista que Lula combatia nos primórdios e para o qual hoje fecha os olhos porque, como se sabe, feio, em eleições, é apenas perder.

Até quando o esporte brasileiro viverá desse modo?

Lembremos que Nuzman quer comandar a operação Rio-16 como Ricardo Teixeira, sua filha e sua turma, comandarão a Copa-14.

Só para planejar a candidatura do Rio, Lula assinou uma medida provisória que destinou R$ 85 milhões ao projeto. E já foi publicada no "Diário Oficial", do dia 1º de outubro, a isenção de ICMS para erguer e reformar estádios para a Copa, convênio do Conselho Nacional de Política Fazendária com o Distrito Federal e todos os Estados. Tudo, portanto, feito com o seu, o meu, o nosso suado dinheirinho.

Mas, em vez de indignação popular, o que se vê é o presidente do STF, Gilmar Mendes, receber Teixeira e pedir a ele apoio da CBF para o programa de recuperação de presidiários do Conselho Nacional de Justiça, iniciativa, é claro, prontamente abraçada pelo cartola. E não por solidariedade ou porque o seguro morreu de velho. Mas por real interesse por quem não conseguiu escapar das grades.

Como se vê, ainda, Lula receber Nuzman, ser bajulado por ele com os mesmos elogios já feitos a FHC ("O presidente que mais fez e fará pelo esporte") sem que se faça menção ao relatório do TCU sobre a gastança do Pan-2007. Folha


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