Os resultados do primeiro turno das eleições municipais confirmaram a expectativa de que a maioria do eleitorado das principais cidades estava propensa a premiar os seus prefeitos com um segundo mandato. O exemplo das capitais é eloqüente. Dos 20 titulares (em 26) aptos a disputar um novo período de governo, nada menos de 13 o conseguiram já na rodada inicial e todos os demais passaram para a prova do próximo dia 26. Os números confirmaram também a recuperação do PMDB como o maior dos "partidos municipais" do Brasil e a tendência histórica do PT de fazer, a cada eleição, um número maior de prefeitos do que na disputa precedente. Nas 79 cidades com mais de 200 mil eleitores, o PT emplacou 13 candidatos e terá outros 15 no segundo turno (11 dos quais saíram na frente no domingo). Seguiram-se o PMDB e o PSDB, que formam com o PT o consolidado trio de frente do sistema partidário nacional.
Contrastando com esses fatos esperados, a ultrapassagem da petista Marta Suplicy pelo prefeito Gilberto Kassab, do DEM, em São Paulo; a ida do candidato Fernando Gabeira, do PV, ao segundo turno, deixando para trás o "bispo" Marcelo Crivella, no Rio de Janeiro; o fracasso do projeto do governador tucano de Minas Gerais, Aécio Neves, e do prefeito petista de Belo Horizonte, Fernando Pimentel, de eleger no primeiro turno o seu candidato, Márcio Lacerda; e ainda a derrota de ACM Neto, o herdeiro político de Antonio Carlos Magalhães, em Salvador, foram as mais comentadas surpresas do pleito - embora, em graus variados, representem a consumação de tendências que se vinham configurando na reta final da campanha. Em conjunto, compõem um retrato alentador da autonomia do eleitorado - em quatro das maiores capitais brasileiras - na hora da decisão. Prova de que os candidatos, seus operadores e apoiadores podem muito, mas não podem tudo, em matéria de indução do voto.
Os casos de Belo Horizonte e São Paulo são especialmente significativos. Na capital mineira, Lacerda, secretário de Planejamento do Estado, era desconhecido da grande maioria, o que se refletia nas pesquisas anteriores ao horário gratuito. Quando o horário eleitoral começou no rádio e na TV e o público ficou sabendo que Lacerda era o candidato do governador e do prefeito aos quais tem dado formidável aprovação, ele disparou nas sondagens. Aos poucos, porém, boa parte do eleitorado - que acompanha, sim, o horário eleitoral - foi se decepcionando com o desempenho do apadrinhado de Aécio e Pimentel e se fixando no rival Leandro Quintão, do PMDB, deputado federal mais votado na cidade. Além disso, desmentindo a crendice de que os eleitores não dão a menor importância à questão partidária, a perplexidade com a aliança entre o governador tucano e o prefeito petista provocou uma migração de preferências para o candidato cujo partido integra a base de apoio do presidente Lula. E a vitória de Lacerda no primeiro turno, que chegou a ser tida como certa, ficou, na melhor das hipóteses, adiada por 3 semanas.
Muitos paulistanos também conheciam mal a figura do prefeito Gilberto Kassab - mas aqui o horário político funcionou notavelmente a seu favor. Mais ainda, pelo visto, quando passou a ser alvo de duros ataques do tucano Geraldo Alckmin. Gradativamente, o eleitorado antipetista, majoritário na cidade, passou a ver em Kassab o nome viável contra Marta, cuja rejeição só não é maior do que a de Paulo Maluf. A divulgação das pesquisas mostrando-o à frente do ex-governador - e, não menos do que ele, capaz de vencê-la no segundo turno - sustentou a ascensão do prefeito e a tendência da queda de Marta. Por fim, no dia da eleição, os indecisos se decidiram, levando às últimas a tendência que vinha se acentuando. Agora, a petista pretende nacionalizar a disputa, contando com a força de Lula - um recurso duvidoso, a julgar pela campanha do primeiro turno que, não só em São Paulo, escancarou os limites da chamada transferência de votos.
O presidente Lula, por exemplo, se empenhou em derrotar o líder da oposição no Senado, José Agripino, do DEM, patrono da candidata Micarla de Sousa, do PV, em Natal. Ela afinal venceu com 193 mil votos (ou 50,8% do total válido). Não serão poucos, entre esses eleitores, os que votaram em Lula e o aprovam. Mas, a cada eleição, maior parcela do eleitorado se move por critérios que lhe são próprios.
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