terça-feira, 26 de agosto de 2008

Terceiro mundo no esporte

Humberto Peron

Fraca. Não existe outra palavra para resumir como foi a nossa participação nos Jogos Olímpicos de Pequim. É lógico que, para os nossos dirigentes falastrões, a campanha foi ótima, já que iguala o nosso recorde de medalhas – 15 - conquistadas há 12 anos em Atlanta.

Desde 1995 no comando do COB, Carlos Arthur Nuzman dava a esperança de mudar o destino do esporte no Brasil - deixo de lado a promessa de nos transformar em uma potência olímpica -, até porque vinha credenciado pelo excelente trabalho na Confederação Brasileira de Vôlei.

Como em 1996 o dirigente teve pouco tempo para mudanças, chegamos à conclusão que o nosso esporte pouco evoluiu nos últimos doze anos. Não avançamos em resultados, continuamos conquistando medalhas nos esportes que tradicionalmente nos dão glórias, como o judô, atletismo, natação, vela, futebol, sem contar o hipismo e o basquete que falharam em Pequim.

Ou seja, em três ciclos olímpicos quem dirige o nosso esporte não conseguiu fazer com que as outras modalidades dessem um salto de qualidade. E temos exemplos que esse espaço de tempo é suficiente para formar uma geração de atletas vitoriosos.

O único salto substancial que tivemos foi na verba que o esporte passou a receber. E, infelizmente, como os resultados provam, usamos muito mal o dinheiro - cansamos de gastar muito dinheiro com esportes e atletas sem condições de evoluir e que já deram provas que não chegarão entre os primeiros em uma Olimpíada.

Estava me esquecendo, mas também melhoramos muito no preenchimento de cadernos de intenções para candidaturas de nossas cidades para abrigar uma edição dos Jogos Olímpicos. Com certeza, temos muitas pessoas que há muito tempo ganham dinheiro nessas nossas candidaturas olímpicas.

O grande problema do esporte brasileiro está no fato de não termos uma base para formar atletas. Por muito tempo a função de formar atletas estava nas mãos dos clubes. Mas já faz algum tempo que esse modelo não funciona. A maioria dos clubes, com problemas financeiros, seja pela perda de associados ou colocando seu orçamento no futebol profissional, não consegue formar mais atletas de nível.

Outra boa fonte de formação de grandes atletas seria a escola, mas todos nós sabemos que isso não existe no Brasil. Pelo interior do país, as escolas não têm um professor de educação física. Nos grandes centros são poucos os estabelecimentos públicos que conseguem ter um lugar decente para que os alunos possam ter uma iniciação esportiva.

No Brasil, o esporte universitário também não existe. As faculdades não querem formar atletas, elas querem formar times fortes, com atletas já consagrados, para fazer propaganda da instituição.

O acaso é o principal componente no processo para achar talentos e formar campeões no Brasil. Pode perceber: todos os nossos campeões contam histórias de que por sorte foram descobertos por técnicos, ou que quase tiveram que abandonar o esporte. É muito duro ver que um atleta olímpico não teve dinheiro para pagar um teste de troca de faixa.

O engraçado é que os dirigentes e ministros falastrões são os primeiros a aparecer para entregar medalhas a todos os atletas que eles pouco se importaram em dar apoio. O engraçado é que tantos dirigentes em nossa delegação tiram lugar de gente que poderia ajudar nossos atletas, como técnicos, por exemplo. Nas conquistas, os cartolas não têm a mínima participação. Pelo contrário, quem vence no esporte brasileiro é quem procurou o seu caminho, treinando no exterior, ou lutando muito para ter um treinador e fazer intercâmbio no exterior.

Resumindo, queremos os campeões, mas continuamos esquecendo que sem uma base forte não dá para se formar uma elite esportiva. É preciso, rapidamente, definir uma política para a revelação de talentos. Não precisa nenhum plano faraônico, pois num país das dimensões do nosso, com a diversidade de biótipos, com um pouco de seriedade conseguiremos formar vários campeões olímpicos.

As nossas confederações adoram construir modernos e luxuosos centros de treinamentos, mas só conseguem treinar nesses lugares os esportistas que conseguem fazer sucesso.

Aliás, pensando bem, nem sei se temos mais de 40 atletas que podem ser considerados elite do esporte mundial. Não posso considerar atletas de primeiro nível esportistas que vão para os Jogos Olímpicos apenas com o objetivo de bater o recorde sul-americano de determinada prova. Recordes continentais têm que ser superados em torneios regionais. Em Olimpíada a obrigação é pensar em superar as marcas mundiais ou olímpicas.

Um país que se preocupa com seu esporte tem que levar para a Olimpíada atletas que podem fazer um bom papel. Não se deve levar esportistas para aprender ou ganhar experiência. Em Jogos Olímpicos, principalmente com o nível atual, tem que ir quem tem condições de ensinar.

Tudo bem que não dá para ganhar medalhas em todas as provas. Mas não dá, por exemplo, para dizer que estamos entre os melhores do atletismo e da natação porque ganhamos uma medalha de ouro. Tirando as duas medalhas de ouro dá para se contar nos dedos quantos atletas chegaram às finais nessas modalidades.

Por fim, no lugar de criarmos milhões de piadas com o sumiço da vara, da queda de bunda do nosso ginasta, ou com a quantidade de bronze que ganhamos, deveríamos gastar essa energia para cobrar dos nossos dirigentes o que eles fazem com o nosso esporte. Folha Online

Humberto Luiz Peron, 40, é jornalista esportivo, especializado na cobertura de futebol, redator da revista Monet e colaborador do Diário Lance.

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