quinta-feira, 13 de março de 2008

Opinião do Estadão: Mais avanços na Justiça

E m vigor desde 2007, o instituto da "repercussão geral" - mecanismo pelo qual o Supremo Tribunal Federal (STF) escolhe os recursos que irá julgar, deixando os processos sem maior relevância social, econômica, política ou jurídica a cargo do Tribunal Superior do Trabalho e do Superior Tribunal de Justiça - acabou não cerceando o acesso à Justiça, como temiam os advogados. Inspirado na experiência da Suprema Corte dos Estados Unidos, o instituto foi introduzido aqui com o objetivo de permitir que o STF dedicasse mais tempo às questões constitucionais, deixando de funcionar como "quarta instância" em conflitos corriqueiros.

Atualmente, os 11 ministros da Corte julgam, em média, cerca de 120 mil processos por ano, cujo teor vai de argüições de inconstitucionalidade de tributos a recursos que envolvem brigas entre vizinhos. O balanço do STF mostra que o mecanismo da "repercussão geral" produziu os resultados esperados, sem pôr em risco o direito de acesso à Justiça dos cidadãos. Por esse mecanismo, quando o Supremo declara a existência de "repercussão" numa matéria, todos os tribunais suspendem o envio de recursos semelhantes, até que o plenário do STF a julgue em caráter definitivo. E a decisão finalmente adotada pela Corte deve ser aplicada aos demais processos de idêntico conteúdo por todas as instâncias e braços especializados do Judiciário, o que ajuda a descongestionar a instituição.

O balanço revela que a mais alta Corte do País foi bastante comedida na aplicação do mecanismo da "repercussão geral". De um total de 38 casos de "repercussão" apreciados pelo plenário, apenas 9 foram considerados irrelevantes. Ou seja, nesses processos, o interesse se circunscrevia somente às partes em confronto. Graças ao instituto da "repercussão geral", o STF deixou de julgar, por exemplo, se cabe indenização por dano moral para torcedor de futebol que se sentiu prejudicado com o rebaixamento de seu time, se há obrigatoriedade de colocação de semáforos em faixas de pedestres, se há responsabilidade civil da União no caso de duplicidade na emissão de Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) e se há possibilidade de redução de multa em sentenças julgadas em caráter definitivo.

Nos demais 29 casos, o STF entendeu que os recursos transcendiam as pretensões das partes, interessando a toda a coletividade. Um dos processos discute se é possível excluir do recolhimento da Contribuição Social sobre Lucro Líquido as receitas oriundas das exportações de bens e serviços. Outra ação de grande relevância diz respeito ao prazo de prescrição que as pessoas físicas têm para reclamar impostos pagos a mais. Também tem "repercussão geral" o recurso em que se discute a obrigação das Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde de fornecer à população remédios que não constam da lista de medicamentos do SUS.

Segundo o balanço do Supremo, que foi divulgado pelo site "Consultor Jurídico", as matérias referentes a direito tributário lideraram o ranking do instituto da "repercussão geral". Depois vêm as questões relativas a direito administrativo. Em terceiro e quarto lugares estão os recursos sobre direito civil e direito constitucional. No último lugar está o direito do trabalho: os ministros do STF avaliaram que só havia repercussão no processo que discutia a execução de contribuição previdenciária em sentenças declaratórias da Justiça do Trabalho.

O balanço do Supremo também informa que o ministro Marco Aurélio foi o que mais votou favoravelmente à aplicação do mecanismo da "repercussão geral", nos casos em que relatou. A ministra Carmen Lúcia Antunes Rocha foi a mais rigorosa, tendo votado pela não aplicabilidade do instituto em cerca de 60% dos recursos em que atuou como relatora.

Assim como a "súmula vinculante", que foi aprovada pela reforma do Judiciário no final de 2004, o sucesso alcançado pelo mecanismo da "repercussão geral" mostra como é possível, sem emendas constitucionais e reformas de códigos, simplificar a legislação processual para que a Justiça ganhe eficiência na prestação de serviços para a sociedade.
Share/Save/Bookmark

Nenhum comentário: