Diante da demora do presidente Lula em acatar a orientação da Comissão de Ética Pública de demitir o ministro do Trabalho, Carlos Lupi, por acumular o cargo com a presidência de um partido político, o embaixador Marcílio Marques Moreira pediu afastamento da presidência do órgão. O pedido foi encaminhado no mesmo dia em que os jornais divulgaram mais irregularidades nos convênios de cooperação técnico-financeira firmados pelo Ministério do Trabalho com organizações não-governamentais (ONGs) para a oferta de cursos de qualificação profissional de jovens.
De um total de R$ 158 milhões em convênios assinados pelo Ministério do Trabalho no final de 2007, cerca de R$ 90 milhões foram destinados a 16 entidades cujos dirigentes são filiados ou parentes de filiados ao PDT, partido do qual Lupi é presidente.
Uma dessas entidades é um asilo de idosos situado em Catanduva, no interior do Estado de São Paulo. Os únicos cursos que ela já ministrou foram para filhos de mães desamparadas - e, mesmo assim, as aulas foram suspensas por denúncia do Ministério Público. Sem nenhuma tradição em matéria de ensino profissionalizante, o asilo é dirigido por um candidato da agremiação à Câmara Municipal e receberá R$ 367 mil dos cofres da União. Para firmar o convênio com o Ministério do Trabalho, que foi intermediado pelo candidato a prefeito e presidente do PDT em Catanduva, a entidade alterou seu estatuto.
Outra entidade beneficiada por Lupi é o desconhecido Instituto Inesp de Treinamento. Sediado na periferia de Guarulhos, ele funciona no quarto dos fundos de uma casa simples. Embora o local esteja fechado há muito tempo, a entidade receberá R$ 5,5 milhões da União para fazer parte de um projeto chamado "Consórcio da Juventude" e treinar 2,5 mil jovens da região. O detalhe é que a ONG já anunciou que irá terceirizar o trabalho para o qual foi contratada. E, mais grave ainda, apesar de o início dos cursos estar previsto somente para abril, ela já teria recebido parte dos recursos. O presidente do Instituto Inesp de Treinamento, ao que consta, tem ligações com o Instituto de Pesquisa e Educação DataBrasil, que foi beneficiado por um convênio de R$ 14,7 milhões com o Ministério do Trabalho e funciona dentro do prédio onde está a Força Sindical, presidida pelo deputado Paulo Pereira da Silva, vinculado a Lupi e líder do PDT em São Paulo.
Apesar dos insistentes pedidos da imprensa, até o momento o Ministério do Trabalho não informou quais os cursos ministrados, os currículos que serão adotados, o total de alunos e os endereços de todas as entidades beneficiadas pelos convênios firmados por Lupi. O órgão limitou-se a emitir nota oficial na qual afirma que os repasses atendem aos princípios da legalidade e da probidade.
A proposta de demissão de Lupi, por estar à frente de dois cargos cujo exercício simultâneo é vedado pelo Código de Conduta da Alta Administração Federal, foi enviada ao presidente da República pela Comissão de Ética Pública no final do ano passado. Na ocasião, com base num parecer da Advocacia-Geral da União, o ministro do Trabalho disse que não havia obstáculos legais à sua permanência no governo. Em resposta, a Comissão de Ética Pública afirmou que o exercício simultâneo das funções de ministro e presidente de partido político é questão moral, e não jurídica.
O impasse continua até hoje. Como Lula não tomou qualquer decisão nem fez comentários sobre o caso, o embaixador Marcílio Marques Moreira decidiu afastar-se da presidência da Comissão de Ética Pública, sendo substituído pelo ex-ministro do STF Sepúlveda Pertence. Tão logo assumiu, Pertence cobrou uma imediata decisão de Lula.
Não tendo desejado tomar a decisão mais prudente e sensata na hora certa, Lula agora se vê diante do dilema de demitir Lupi, correndo o risco de perder o apoio do PDT no Congresso, ou mantê-lo no cargo, o que compromete sua autoridade e desmoraliza seu governo - principalmente depois que se vai tornando claro que a permanência na presidência do PDT é o menos grave dos seus deslizes éticos.
O Estado de S.Paulo - O ministro não se abala
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